sexta-feira, 14 de agosto de 2015

O grande dia da Rosetta ao Sol

A sonda Rosetta testemunhou a maior aproximação do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko ao Sol.

cometa próximo do periélio

© ESA/Rosetta/MPS (cometa próximo do periélio)

Esta série de imagens do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko foi captada pela câmara OSIRIS da Rosetta no dia 12 de agosto de 2015, meras horas antes do cometa ter alcançado o ponto mais próximo do Sol ao longo da sua órbita de 6,5 anos.
Foram obtidas a uma distância de aproximadamente 330 km do cometa. A atividade do cometa, que atingirá o seu pico de intensidade nas próximas semanas, é claramente visível nestas imagens espetaculares.

A câmara científica captou imagens poucas horas antes do periélio. A atividade do cometa é claramente vista nas imagens, com uma variedade de jatos provenientes do núcleo, incluindo uma explosão fotografada às 17:35 GMT de anteontem.

O momento exato do periélio ocorreu às 02:03 (GMT) de ontem, quando o cometa passou a 186 milhões de quilômetros do Sol.

No ano que já passou desde a chegada da Rosetta, o cometa viajou cerca de 750 milhões de quilômetros ao longo da sua órbita em direção ao Sol, a crescente radiação solar aqueceu o núcleo, fazendo com que os seus gelos escapassem como gás para o espaço a um ritmo cada vez maior. Estes gases, juntamente com as partículas de poeira que arrastam, fazem crescer a atmosfera (cabeleira) e a cauda do cometa.

"A atividade permanecerá assim tão alta durante muitas semanas, e estamos ansiosos por descobrir quantos mais jatos e eventos explosivos conseguimos apanhar em flagrante, tal como já testemunhamos nas últimas semanas," afirma Nicolas Altobelli, cientista do projeto Rosetta.

As medições da Rosetta sugerem que o cometa está libertarando até 300 kg de vapor de água por segundo, o equivalente a duas banheiras. Este valor é 1.000 vezes superior ao observado há um ano atrás quando a Rosetta estava em aproximação ao cometa. Nesse momento, registrava uma taxa de apenas 300 gramas por segundo, o equivalente a dois copos pequenos de água.

Juntamente com o gás, estima-se que o núcleo liberte até 1.000 kg de poeira por segundo, criando perigosas condições de trabalho para a Rosetta.

"Nos últimos dias, fomos forçados a afastar a sonda ainda mais do cometa. Estamos a uma distância entre 325 e 340 km esta semana, numa região onde consegue seguir as estrelas e operar sem se confundir com os níveis excessivos de poeira; se não funcionar corretamente, a Rosetta não consegue posicionar-se no espaço," comenta Sylvain Lodiot, gestor de operações da ESA.

O monitoramento das mudanças do ambiente em torno do cometa antes, durante e depois do periélio, é um dos objetivos científicos primários a longo prazo da missão.

Ao longo dos últimos meses, as estações do cometa mudaram, atirando o seu hemisfério sul para um verão curto, cerca de 10 meses, depois de mais de cinco anos e meio de escuridão. Isto revelou partes da superfície, anteriormente à sombra durante a estadia da Rosetta, permitindo aos cientistas preencherem algumas das peças que faltavam ao mapa regional.

Identificaram quatro novas regiões geológicas no hemisfério sul, que incluem partes de ambos os lóbulos do cometa, elevando o número total de regiões para 23. Os nomes das novas regiões seguem a convenção de nomenclatura de deuses e deusas egípcios adotada para o cometa: Anhur, Khonsu, Sobek e Wosret.

A temperatura média do cometa também está aumentando. Não muito tempo depois de chegar, as temperaturas à superfície rondavam os -70ºC. Em abril-maio de 2015 tinham subido para apenas alguns graus abaixo de zero, e agora prevêem-se máximas de algumas dezenas de graus positivos para o próximo mês.

Entretanto, os astrônomos na Terra têm acompanhado, ao longe, a evolução do cometa. A Rosetta está demasiado perto do cometa para ver a sua cauda crescer, mas as imagens recolhidas ao longo dos últimos meses, com telescópios de todo o mundo, mostram que já se estende por mais de 120.000 km.

Foi revelada em imagens uma coma assimétrica, com uma região de notável alta densidade na direção oposta à cauda principal, imagens estas que também foram obtidas na semana passada pelo telescópio Gemini-Norte em Mauna Kea, Havaí.

"A combinação destes pontos de vista terrestres, e dos jatos individuais e explosões vistos de perto com a Rosetta, vão ajudar-nos a compreender os processos à superfície do cometa à medida que se aproxima do Sol," acrescenta Nicolas.

"Pretendemos voltar novamente para muito mais perto depois da diminuição de atividade e fazer um levantamento de como o cometa mudou. Também continuamos a manter a esperança que o Philae consiga retomar as suas operações científicas à superfície e nos dê uma visão detalhada das mudanças que ocorrem em torno do seu local de aterragem."

Finalmente, Patrick Martin, gestor da missão Rosetta da ESA, conclui: "É emocionante atingir a marca do periélio e estamos ansiosos por ver como é que este incrível cometa se comporta à medida que nos afastamos do Sol durante o próximo ano."

Fonte: ESA

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Jatos cometários antes do periélio

Na aproximação ao periélio das últimas semanas, a sonda Rosetta tem vindo a assistir a um aumento de atividade do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, durante a qual um evento dramático e explosivo provou ser tão poderoso que até afastou o próprio vento solar.

outburst de curta duração no cometa

© ESA/Rosetta/MPS (outburst de curta duração no cometa)

A imagem acima mostra uma explosão de curta duração no cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, captada pela câmara OSIRIS da Rosetta no dia 29 de julho de 2015. A imagem à esquerda foi obtida às 13:06 GMT e não mostra sinais visíveis do jato. É muito forte na imagem do meio obtida às 13:24 GMT. Os traços residuais da atividade são muitos muito fracos na imagem final obtida às 13:42.

O cometa alcança o periélio na quinta-feira, o momento da sua órbita de 6,5 anos em que está mais próximo do Sol. Nos últimos meses, o aumento da energia solar tem aquecido os gelos do cometa, transformando-os em gás que é libertado para o espaço, arrastando com ele poeira.

O período ao redor do periélio é cientificamente muito importante, pois a intensidade da luz solar aumenta e partes do cometa, anteriormente à sombra, até durante anos, são inundadas com a luz do Sol.

Apesar da atividade geral do cometa atingir o pico nas semanas que se seguem ao periélio, tal como os dias mais quentes do verão geralmente vêm depois dos dias mais longos, podem ocorrer explosões súbitas e imprevisíveis a qualquer momento, como já foi visto no início da missão.

No dia 29 de julho, a Rosetta observou a explosão mais dramática até à data, registada por vários dos seus instrumentos a cerca de 186 km do cometa. Fotografaram a explosão no núcleo, testemunharam uma mudança na estrutura e composição do ambiente da cabeleira gasosa que rodeia a Rosetta e detectaram um aumento nos níveis de impactos de poeira.

Talvez ainda mais surpreendente, a Rosetta descobriu que a explosão tinha afastado o campo magnético do vento solar em torno do núcleo.

Uma sequência de imagens obtidas pela câmara científica OSIRIS da Rosetta mostra o aparecimento súbito de uma característica bem definida e em forma de jato que emerge do lado do pescoço do cometa, na região de Anuket. A equipe da câmara estima que o material no jato podia estar viajando, pelo menos, a 10 m/s, talvez bastante mais rápido.

"Este é o jato mais brilhante que vimos até agora," comenta Carsten Güttler, membro da equipe OSIRIS no Max Planck Institute for Solar System Research em Göttingen, Alemanha.

"Geralmente, os jatos são muito tênues em comparação com o núcleo e precisamos de esticar o contraste das imagens para torná-los visíveis, mas este é mais brilhante que o núcleo."

Pouco depois, o sensor de pressão do instrumento ROSINA detectou indícios claros de mudanças na estrutura da cabeleira, enquanto o seu espectrômetro de massa registou alterações na composição dos gases emanados.

Por exemplo, em comparação com medições feitas dois dias antes, a quantidade de dióxido de carbono aumentou por um fator de dois, metano por quatro, sulfureto de hidrogênio por sete, enquanto a quantidade de água permaneceu quase constante.

"Esta primeira 'olhada rápida' às nossas medições depois da explosão é fascinante," afirma Kathrin Altwegg, pesquisadora principal do ROSINA na Universidade de Berna. "Vemos também pistas de material orgânico depois da explosão, que pode estar relacionado com a poeira ejetada."

"Mas, embora seja tentador pensar que estamos detectando material que pode ter sido libertado do interior do cometa, é muito cedo para dizer com certeza que este é o caso."

Cerca de 14 horas depois da explosão, o GIADA detectava impactos de partículas de poeira a taxas de 30 por dia, em comparação com apenas 1 a 3 por dia no início de julho. Foi registado um pico de 70 durante um período de 4 horas no dia 1 de agosto, indicando que a explosão continuava tendo um efeito significativo sobre o ambiente de poeira nos dias seguintes.

"Não foi apenas a abundância das partículas, mas também as suas velocidades medidas pelo GIADA, que nos disseram que algo 'diferente' estava acontecendo: a velocidade média das partículas aumentou de 8 m/s até cerca de 20 m/s, com picos de 30 m/s; uma bela festa de poeira!", comenta Alessandra Rotundi, pesquisadora principal da Universidade de Nápoles "Parthenope", na Itália.

Talvez o resultado mais surpreendente é que a explosão foi tão intensa que até conseguiu empurrar o vento solar para longe do núcleo durante alguns minutos, uma observação única efetuada pelo magnetômetro do conjunto de instrumentos RPC da Rosetta.

O vento solar é o fluxo constante de partículas eletricamente carregadas oriundas do Sol, transportando o seu campo magnético para o Sistema Solar. As medições anteriores feitas pela Rosetta e pelo Philae já tinham mostrado que o cometa não era magnetizado, por isso a única fonte para o campo magnético medido em seu redor é o vento solar.

Mas o vento solar não passa desimpedido. Dado que o cometa expele gás, o vento solar fica como que "paralisado" quando encontra esse gás e é atingido um equilíbrio de pressão.

"O campo magnético do vento solar começa a amontoar-se como um engarrafamento e eventualmente deixa de se mover na direção do núcleo do cometa, criando uma região livre de campos magnéticos no lado virado para o Sol do cometa, a que chamamos 'cavidade diamagnética'," explica Charlott Götz, da equipe do magnetômetro no Institute for Geophysics and extraterrestrial Physics em Braunschweig, Alemanha.

cavidade diamagnética

© ESA/Rosetta/RPC/IGEP/IC (cavidade diamagnética)

As cavidades diamagnéticas fornecem informações fundamentais sobre a forma como um cometa interage com o vento solar, mas a única detecção prévia de tal cavidade associada com um cometa tinha sido feita a cerca de 4.000 km do cometa Halley quando a sonda Giotto da ESA por lá passou em 1986.

O cometa da Rosetta é muito menos ativo que o Halley, por isso os cientistas esperavam encontrar uma cavidade muito menor, talvez no máximo com algumas de dezenas de quilômetros. Antes de 29 de julho, não tinham observado quaisquer sinais de uma cavidade diamagnética.

Mas, após a explosão desse dia, o magnetômetro detectou uma cavidade diamagnética que se prolongava, pelo menos, até 186 km do núcleo. Foi provavelmente criada pela libertação do gás, que aumentou o fluxo de gás neutro na cabeleira do cometa, forçando o vento solar a "parar" mais longe do cometa e assim empurrando a fronteira da cavidade para fora, para lá de onde a Rosetta viajava no momento.

"A Rosetta foi movida até distâncias de 300 km nas últimas semanas, a fim de evitar problemas com a navegação, problemas estes que podem ser provocados por poeira, e tínhamos considerado que a cavidade diamagnética estava, por enquanto, fora do nosso alcance. Mas parece que o cometa deu-nos uma mãozinha, trazendo a cavidade até à Rosetta," afirma Matt Taylor, cientista do projeto Rosetta.

"Este é um evento fantástico que vai levar tempo para ser analisado, mas realça os excitantes momentos que estamos testemunhando no cometa durante esta 'quente' fase do periélio."

Fonte: ESA

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Rosetta ao redor de cometa durante um ano

A missão Rosetta da ESA celebrou ontem um ano ao redor do cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko e a sua maior aproximação ao Sol ocorrerá nesta semana.

cometa  67P Churyumov-Gerasimenko

© ESA/Rosetta/NAVCAM (cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko)

Esta imagem do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko foi obtida pela câmara de navegação da Rosetta no dia 30 de julho de 2015 a uma distância de 178 km do centro do cometa. A imagem tem uma resolução de 15,2 m/pixel e abrange 15,6 km.

Foi uma viagem longa mas emocionante para a Rosetta desde o seu lançamento em 2004. Passou pela Terra, por Marte e por dois asteroides antes de alcançar o seu destino final no dia 6 de agosto de 2014. Nos meses seguintes, a missão tornou-se a primeira a orbitar um cometa e a primeira a pousar suavemente um módulo, o Philae, à superfície.

As equipes da missão tiveram que superar muitos desafios, tiveram que aprender a voar num ambiente imprevisível e por vezes inóspito. A sonda enviou um tesouro de dados científicos deste cometa intrigante, abrangendo o seu interior, a sua superfície dramática e a nuvem circundante de poeira, gás e plasma.

"Esta missão é sobre descobertas científicas e todos os dias temos algo novo para admirar e tentar compreender," afirma Nicolas Altobelli, cientista do projeto Rosetta.

"Um ano de observações perto do cometa forneceu-nos uma riqueza de informações e estamos ansiosos por mais um ano de exploração."

Os destaques, até agora, incluem a descoberta de que o vapor de água do cometa tem um "sabor" diferente dos oceanos da Terra, alimentando o debate sobre o possível papel dos cometas e asteroides que forneceram água ao nosso planeta ao longo da sua história.

A primeira detecção de nitrogênio molecular num cometa forneceu pistas importantes sobre o ambiente de temperatura durante o "nascimento" do cometa. O nitrogênio molecular era comum durante a formação do Sistema Solar, mas necessitava de temperaturas muito baixas para ficar preso no gelo, de modo que as medições da Rosetta suportam a teoria que os cometas são originários do frio e distante Cinturão de Kuiper.

Os dados recolhidos pela Rosetta e pelo Philae durante a descida à superfície permitiram aos cientistas deduzir que o núcleo do cometa não é magnetizado, pelo menos em grandes escalas.

Apesar de se pensar que os campos magnéticos desempenharam uma função importante no movimento de pequenos grãos magnetizados de poeira no Sistema Solar jovem, as medições da Rosetta e do Philae mostram que não continuaram a desempenhar um papel significativo quando as partículas formaram blocos maiores com vários metros de diâmetro.

Estes são apenas alguns dos inúmeros exemplos de descobertas científicas da Rosetta e a maioria vem de dados obtidos durante o início das atividades cometárias.

momentos do primeiro ano da Rosetta em órbita do cometa

© ESA (momentos do primeiro ano da Rosetta em órbita do cometa)

Agora, o cometa e a sonda estão a uma semana do periélio, o ponto da sua órbita de 6,5 anos em que está mais próximo do Sol. No dia 13 de agosto, estarão a 186 milhões de quilômetros do Sol, cerca de um-terço da distância do encontro de há um ano atrás.

"O período de tempo em torno do periélio é cientificamente muito importante, pois o calor do Sol e a resultante saída de gás e poeira atingem o máximo, fornecendo pistas importantes sobre este momento fundamental no ciclo de vida total do cometa," comenta Nicolas.

"Por exemplo, as mudanças à superfície podem revelar material fresco que ainda não foi alterado pela radiação solar ou pelos raios cósmicos, dando-nos uma janela sobre as camadas subsuperficiais do cometa; esta será a primeira vez na exploração de cometas que as mudanças à superfície podem ser monitoradas em relação ao aumento de atividade."

A Rosetta tem estudado o aumento de atividade ao longo dos últimos meses, à medida que os seus gelos aquecem, tornam-se em gás e são expelidos para o espaço, arrastando poeira cometária. Juntos, o gás e a poeira criam uma atmosfera difusa, ou cabeleira, ao redor do núcleo e uma longa cauda que estende-se por mais de 120.000 km para o espaço, cauda esta que só pode ser vista de longe.

A Rosetta tem um lugar de destaque no estudo de onde e como esta atividade surge à superfície do cometa. No início de 2015, a sonda passou a apenas 6 km para finalizar algumas medições, mas à medida que o nível de gás e poeira aumentava, a Rosetta foi forçada a estudar o cometa a partir de distâncias mais seguras, e opera atualmente entre os 250 e os 300 km.

"À medida que o periélio se aproxima, as operações perto do cometa provaram ser especialmente difíceis: o aumento do nível de poeira cometária confunde os navegadores estelares da Rosetta e, sem estes funcionando corretamente, a Rosetta não consegue orientar-se devidamente no espaço," afirma Sylvain Lodiot, gestor das operações da Rosetta.

"Todas as equipes envolvidas, incluindo o controle de voo, dinâmica de voo e operações científicas, tiveram que aprender a adaptar-se a estas condições em tempo real. Tivemos que repensar totalmente o modo como operamos a sonda e tivemos que planejar as atividades científicas em escalas de apenas alguns dias ou semanas. Tem sido um grande desafio, mas certamente torna a missão ainda mais emocionante."

Um aspeto importante do estudo a longo prazo da Rosetta será a observação da diminuição da atividade cometária nos meses que se seguem ao periélio. A esperança é que a Rosetta acabará por ser capaz de se aproximar, novamente, do núcleo e ver como a superfície mudou durante o encontro próximo com o Sol.

"Um ano depois da chegada, a Rosetta acumulou uma série de êxitos impressionantes," desde a aterragem do Philae, até às muitas descobertas científicas e consequentes publicações," acrescenta Patrick Martin, gestor da missão Rosetta.

"A colheita científica deve continuar até ao próximo ano, enquanto observamos o comportamento pós-periélio do cometa, antes do grande final da Rosetta, marcado para setembro de 2016, quando planejamos fazer pousar a sonda no cometa."

Fonte: ESA